B.R. - advogada #2

(Des)encontros em tempo de Corona

Vontade de não te falar, amor, que essa distância forçada me fez ver o quanto a gente não combina...

Queria poder dizer que estar longe é o de menos e que eu ainda sinto aquela conexão quando olho nos seus olhos pela tela do celular...

Queria tanto dizer, amor, que eu fiquei onde eu tava...que eu não viajei por vários cantos dentro de mim...

Que não olhei pra tanta coisa que doía e pra tanta coisa que brilhava...

Que desejo louco de não te dizer, amor, que encontrei mais uma porção de gostos meus que vão te dar vergonha e talvez trazer um peso desnecessário pra sua vida...

Incontrolável o ímpeto de te dizer que eu não trabalho demais e nem falo demais sobre trabalho...eu só não tenho o mesmo privilégio que vc e isso não me faz menos interessante...

Necessário te dizer, amor, que quero estudar sempre, pra entender os movimentos do mundo e pra me entender...

Quero entender o racismo estrutural, o lugar de fala, porque não conseguimos que a tomada de decisão na nossa sociedade inclua indivíduos diversos, porque as pessoas não podem ser livres pra amar quem elas quiserem, porque determinadas piadas não têm graça e tantos outros assuntos...

Quero muito te dizer que não sei muito de muita coisa, mas quero saber...quero sentir que to do lado certo a cada decisão, a cada ação e a cada palavra...

Quando eu sentir que não estou, quero pedir desculpas e ouvir, aprender, refletir, compreender, dar espaço pra quem precisa e deve falar, quero conviver com pessoas diferentes de mim e de nós...

Daí a vontade louca de te dizer, amor, que eu não aguento mais pedir comida dos mesmos lugares e ver as mesmas séries e filmes...

Eu quero uma perspectiva cubista da vida, eu quero ajudar a inventar o mundo...

E vc quer sair sempre com os mesmos amigos (os seus, claro) e almoçar nos seus avós todo domingo...

Estar isolada de vc me fez perceber que eu mudei...e que talvez eu não saiba mais andar tão devagar pra te acompanhar...

Quero te desejar as coisas mais lindas no seu caminho, que não é mais o mesmo que o meu...e que quando tudo isso acabar possamos sorrir e enxergar as mesmas flores das nossas perspectivas tão diferentes...